«Souto Moura pede que lhe mostrem a tese da cabala»
«O procurador-geral da República admite falhas no polémico processo da Casa Pia, mas responde indirectamente a Paulo Pedroso "Se continuam a afirmar a inocência e a dizer que isto é tudo uma construção e uma cabala, porque é que em três anos nunca me trouxeram elementos por onde eu pudesse puxar para confirmar essa tese? "A resposta de Souto Moura, em forma de pergunta - em declarações à Agência Lusa - é um comentário à decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que concluiu pela inexistência de indícios que justificassem julgar Paulo Pedroso no âmbito do processo Casa Pia. Assim, o caso transita em julgado (sem hipótese de mais recursos), confirmando a tese antes defendida pela juíza de instrução Ana Teixeira e Silva. Souto Moura explica que a investigação do processo Casa Pia "não foi a ideal", devido a "resistências de todos os lados". Paulo Pedroso, note-se, anunciou ontem a intenção de processar os responsáveis envolvidos "na condução da investigação" do processo, os quais o implicaram nos alegados abusos sexuais. "Sei que quem conduziu o inquérito judicial a meu respeito agiu sem presumir sequer a possibilidade da minha inocência", acusa, lembrando que o inquérito foi "avocado pelo próprio procurador-geral da República". Embora avocado, quem no terreno conduziu as investigações foi o procurador da República João Guerra, para quem a tese da cabala visava apenas perturbar as investigações. "A perturbação resulta evidente numa escuta telefónica em que Ferro Rodrigues se congratula de que tinha conseguido, juntamente com os seus amigos 'ao longo da tarde alimentar a ideia de que... levantar a dúvida', refere o magistrado no recurso apresentado no TRL contra a decisão de Ana Teixeira e Silva. Em sua óptica, a cabala não passa de uma "construção" de responsáveis do PS, com o objectivo de "agitar a opinião pública", levando "as pessoas, em geral, a desconfiar das investigações e da acção da justiça". Souto Moura volta a pegar na ideia da cabala e a questionar a sua existência. Do mesmo modo, nas declarações que faz à Lusa, volta a repetir a ideia já sublinhada na cerimónia que assinalou os 25 anos do MP, segundo a qual, "a partir do momento em que se começaram a detectar suspeitas em pessoas com poder, ninguém mais quis saber das crianças, nunca mais se falou do escândalo da Casa Pia. A preocupação foi dizer que a investigação foi disparatada", acusou. Sobre a investigação do MP, Souto Moura assume alguns erros na sua condução, mas sublinha que foi feito o melhor possível. "Não foi a investigação ideal, mas foi a possível com os condicionalismos que havia na altura. Acho que se fez uma obra notável porque se lutou contra resistências que vinham de todos os lados. Foi extremamente árduo", afirmou. A equipa de investigadores também lhe mereceu um aplauso. "A equipa do MP fez um trabalho notável de persistência, capacidade de trabalho e de selecção", sublinhou, garantindo estar de "consciência tranquila". Mas houve erros, sem interferência no resultado final, que têm de ser reconhecidos. "Há um ou outro episódio de que me arrependo, não que o resultado pudesse ter sido diferente, mas poderiam ter sido evitados incómodos. "O PGR deu como exemplo o álbum de fotografias com figuras públicas, a maioria das quais sem ligação ao processo, que foram mostradas às alegadas vítimas para que estas identificassem os agressores. Álbum que acabaria publicado na imprensa. "Se eu soubesse também tinha colocado lá a minha fotografia, mas, neste episódio, mais uma vez se confundiu o acessório com o essencial", referiu. Recorde-se que Paulo Pedroso chegou a estar acusado de 23 crimes de abuso sexual de crianças, tendo passado cinco meses em prisão preventiva. "Em democracia ninguém está acima da lei e ninguém pode ser isentado de responsabilidade pelos seus actos. Por isso, pedi à minha defesa que accionasse os procedimentos legais necessários para que sejam reparados os danos que essas condutas e omissões de deveres me causaram", diz Pedroso num texto divulgado na Internet em ocanhoto.blogspot.com.».
In Diário de Notícias, 07/12/2005.
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