quinta-feira, dezembro 22, 2005

Artigo de Opinião

Eduardo Dâmaso, In Diário de Notícias, 22/12/2005.
«CORRUPÇÃO
A direcção da PJ tem toda a legitimidade para reorganizar o combate à corrupção mas não pode ficar sombra de dúvida sobre as suas intenções.
A Polícia Judiciária está a fazer mudanças no combate à corrupção e já não se livra de uma suspeição liminarmente lançada no sentido de criar uma verdade mediática: a PJ está a desinvestir no combate à corrupção. Os responsáveis desta polícia de investigação criminal viram-se ontem obrigados a dar esclarecimentos que porventura não desejariam para já dar. O episódio é um excelente exemplo de várias coisas que não devem acontecer quando se trata de matérias tão delicadas. A direcção da polícia tem toda a legitimidade para fazer as mudanças que bem entende, assim elas obedeçam a uma lógica de eficácia e transparência. A corrupção é um crime elástico, pois muitas vezes é o núcleo essencial de uma investigação, mas noutras surge associado a outros crimes que, num caso concreto, produzem maior dano social. Neste contexto, a definição de estratégias, de gestão de meios, de adequação de perfis, é uma competência própria da direcção da PJ. Nada a dizer! O que não se compreende é que tenha deixado derrapar o processo, perdido a iniciativa e sido obrigada a dar explicações já não sobre as eventuais vantagens das mudanças mas para tentar dissipar a ideia de que não vai acabar a secção de combate à corrupção. Por muito que se esforce, agora, a dúvida vai permanecer por algum tempo. Num segundo plano, é errado que esta discussão se venha a fazer numa perspectiva de barricada, ou seja, a direcção da polícia escondida numa e os dirigentes da associação sindical noutra. Ou que venha a ser uma discussão instrumental para outras de dimensão puramente reivindicativa em matéria de carreiras, salários, suplementos. A instrumentalização do combate à corrupção é suicida para todos. Ou há um problema ou não. Direcção da PJ e ASFIC têm obrigação de clarificar a questão. Nos dias que correm são poucos os que se interessam pelas formas de organização desse combate, embora façam mal, porque os níveis de eficácia podem ser medidos a partir daí. É, no entanto, compreensível que assim seja e que basicamente se peça à direcção da PJ e aos seus funcionários que não se envolvam em polémicas cujo alcance não se entende e passem a olhar para os abundantes sinais de materialização da corrupção na vida pública as irregulares ou opacas adjudicações de obras, a falta de controlo sobre as gigantes e frequentes derrapagens dos custos, a falta de controlo sobre o desperdício e má aplicação de subsídios e financiamentos comunitários, a persistente sangria de empresas públicas pelos caminhos do compadrio e do nepotismo. Está na hora, convenhamos, de fazer alguma coisa. Pouca que seja...».

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