sábado, dezembro 10, 2005

Críticas à Lei-Quadro da Política Criminal

«Procuradores estão contra projecto da lei criminal
Todos contra um. Os magistrados do Ministério Público fizeram ontem, em Coimbra, duras críticas ao projecto de Lei-Quadro da Política Criminal, estando frente-a-frente com o coordenador da Unidade de Missão para a Reforma Penal, Rui Pereira. No entanto, os magistrados, que temem a governamentalização do sector, não estão sozinhos no ataque à proposta aprovada em Conselho de Ministros no início deste mês. "Nunca se deveria avançar com uma lei-quadro da Política Criminal sem a criação de um Instituto de Criminologia que nos dê um retrato do tipo de criminalidade e as respostas de como actuar", alertou Costa Andrade, catedrático de Direito de Coimbra, um dos participantes no debate promovido pelo Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP). Esta polémica surge perante a aprovação por parte do Governo de uma proposta de lei-quadro da política criminal, em cujo articulado o Executivo passará a definir, em princípio, de dois em dois anos, as prioridades da política criminal. Ora, estando para breve a sua aprovação no Parlamento, esta conferência nacional assumiu particular relevância. "Acho que Portugal se deve dotar de uma lei destas", disse Costa Andrade, advertindo que esta proposta lhe "suscita algumas dúvidas, perplexidades e discordâncias". Desde logo porque "não se preocupa com a ressocialização" e, ainda, porque "sendo o juiz o grande protagonista da prática da política criminal, esta lei não pode existir sem pensar nos tribunais". Denunciou "Esta lei-quadro é uma lei de um dos muitos paradigmas da política criminal. Aqui é só para o Ministério Público. Poderá fazer-se política criminal na base desta assintonia?". E utiliza uma metáfora para expressar a sua visão desfavorável: "Está a criar-se uma auto-estrada para o Ministério Público e depois os tribunais estão numa vereda...". A jurista Paula Teixeira da Cruz assumiu claramente que "esta é uma lei péssima, cujo nome não corresponde ao conteúdo". Mais "Esta lei põe em causa a separação de poderes e responsabiliza politicamente quem o não deve ser. Esta é uma forma do poder político se desresponsabilizar dos problemas da justiça". Ao assumir que "este projecto é lamentável, um jogo de espelhos", Paula Teixeira da Cruz asseverou que, neste enquadramento, poderão "aumentar os equívocos" até porque, em seu entender, dever-se-iam levantar, antes, outras questões, tais como "a formação, a especialização e o fortalecimento de todos os operadores". Já Euclides Dâmaso, director do Departamento de Investigação e Acção Penal de Coimbra, defendeu a "criação de um órgão independente ou autónomo em relação aos demais poderes do Estado" para executar ou coordenar "as políticas e práticas de prevenção adequadas". Rui Pereira disse que esta lei não belisca a independência dos tribunais e visa apenas "responsabilizar os órgãos de soberania pelas suas escolhas". E considerou que "se houvesse meios infinitos não seria necessário definir uma política destas", desdramatizando os receios de instrumentalização».
In Diário de Notícias, 10/12/2005.
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«Justiça critica lei criminal
A proposta da nova Lei-Quadro da Política Criminal mereceu ontem críticas dos profissionais da Justiça, numa conferência em Coimbra.
O penalista Costa Andrade considera que “corre o risco de aumentar ainda mais a desconfiança e a descrença nas leis”, frisando que é “uma lei de cúpula”, pois “deixa de fora os tribunais, as prisões e todos aqueles por onde passa a política criminal”. “É uma péssima lei, porque o nome não corresponde ao seu conteúdo – a designação é Lei-Quadro da Política Criminal, mas de política criminal não tem rigorosamente nada”, disse a advogada Paula Teixeira da Cruz. “É uma lei que responsabiliza politicamente quem não deve e desresponsabiliza a função política pelos erros do sistema judicial. ”Rui Pereira, coordenador da Unidade de Missão para a Reforma Penal, entende o contrário. “A Lei assume perante os cidadãos a política de combate ao crime”».
In Correio da Manhã, 10/12/2005.
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«Nova Lei "nada resolve"
Uma lei que nada resolve, que não é necessária, que deixa de fora os tribunais e que coloca em causa a autonomia do Ministério Público (MP). Este foi o tom da conferência sobre a nova lei-quadro da política criminal, organizada ontem, em Coimbra, pelo Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP). Apesar da garantia dada no início do debate por Rui Pereira (responsável pela elaboração do anteprojecto em causa), de que esta não é "uma lei contra as magistraturas" e que "só haveria o perigo de instrumentalização se o Governo pudesse seleccionar processos em concreto", ao lembrar que as prioridades são "definidas em abstracto e terão de respeitar" a Constituição, foram mais as críticas do que os elogios. Uma das mais duras intervenções pertenceu à advogada Paula Teixeira da Cruz para quem a nova lei é uma "frontal violação" de dois princípios básicos do Estado de Direito: legalidade e autonomia do MP. Já para Costa Andrade, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, é uma lei com "deficiências e insuficiências técnicas", que nem sequer vincula o juiz, quando muitos dos institutos sobre os quais recai a lei passam precisamente pela sua concordância ou decisão. "Temos o paradigma da política criminal para o MP e fica de fora toda a outra política criminal", o que leva Costa Andrade a concluir que se vai "criar uma auto-estrada para o MP", enquanto os tribunais "estão numa vereda". Ao defender que a lei fosse mais ampla e precedida de estudos, Costa Andrade sublinhou que "nunca se deveria avançar com uma lei-quadro da política criminal" sem criar um Instituto de Criminologia. Acrescentou ainda que "não se pode pensar que os problemas se resolvem com uma lei", dizendo não conhecer outro país com tal idolatria pelas leis.Também Paula Teixeira da Cruz diz que o projecto é "um jogo de espelhos", que "nada resolve". Ao lembrar que as prioridades já estão definidas na lei penal, a advogada considera que esta é "uma forma do poder político se desresponsabilizar dos problemas que o sistema judicial suscita". Acrescenta até que "é uma brecha no princípio da separação de poderes". Na mesma linha, a deputada Odete Santos questionou "Esta lei é precisa? Para quê?", afirmando-se preocupada com a previsível alteração do estatuto do MP. O presidente do SMMP, António Cluny, considerou que as resoluções que o Parlamento viesse a tomar deveriam ser aprovadas por uma maioria qualificada, para "afastar a ideia de poder haver uma governamentalização da política criminal"».
In Jornal de Notícias, 10/12/2005.

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