sexta-feira, maio 19, 2006

Entrevista ao Bastonário da O.A.

In D.N.
Porque é que os cidadãos têm uma imagem negativa do advogado, em particular, e da justiça, em geral?
As pessoas não têm essa imagem da advocacia mas quer-se à força que tenham. O Conselho distrital de Lisboa promoveu um estudo com um inquérito a mais de mil pessoas, que revela algumas tendêncas. Entre elas, a de que a maioria das pessoas tem confiança no seu advogado... .
..mas há a ideia de que os advogados recorrem a expedientes para atrasar os processos...
Uma coisa é o uso outra é o abuso, A regra geral é que os advogados utilizam com rigor e com sentido ético e deontológico os meios processuais ao seu dispor. Depois, há as excepções, que devem ser sancionadas. De repente criou-se uma alergia aos recursos e isso é uma tendência perigosíssima... a presunção de que os tribunais acertam à primeira é absolutamente ilidível.
Mas os advogados não abusam desta figura jurídica?
Nunca o abuso pode inibir o uso.
A advocacia está a enfrentar a sua pior crise de sempre?
A advocacia vive um momento de crise e está a ser alvo de um ataque sem precedentes. A convergência de um enorme contingente de advogados, a drástica diminuição da esfera de intervenção dos advogados e uma retirada, até do ponto de vista legal, das suas prerrogativas criaram um caldo difícil que é, ele próprio, o culpado da crise.
Esse ataque é feito por quem?
Por um lado, há uma campanha maçica contra o prestígio da advocacia com ideias feitas como os advogados são caros, atrasam.... São ideias mal feitas. Depois, há uma tentação da União Europeia, obcecada pelo problema da segurança, de tornar o advogado um delator, desguarnecendo as defesas das pessoas.
A independência do advogados está em risco?
Claramente, e os advogados sentem que há essa tentativa de sufoco, essa tentativa de os amestrar e de os amolecer, mas quem perde são os cidadãos que precisam de exercer os seus direitos através da coragem e da independência do advogado, através de um advogado sem medo. Por vezes, é necessário dizer coisas antipáticas e tomar posições antipáticas e isso pressupõe o tal advogado independente, que não pode ficar debilitado com ameaças de ser processado, de ser considerado cúmplice ou, no mínimo, um amigo dos maus.
Como vê a intenção do Governo de contratar advogados, em substituição do Ministério Público, para o defender nos processos de responsabilidade civil extracontratual?
Faz todo o sentido. Quem deve patrocinar as partes em tribunal são os advogados.
Concorda com a abertura da magistratura a não licenciados em Direito?
Não vejo neste momento qualquer interesse em discutir o problema nesses termos. Deve manter-se o princípio segundo o qual o acesso ao CEJ deve ser feito a partir de licenciados em Direito.
Há anos que se aponta o caminho para retirar a justiça da crise. Porque é que não se avança?
Para que a reforma triunfe é necessário uma programação de curto, médio e longo prazo, que seja executada sem hiatos e que não seja alterada quatro vezes em 10 anos. Para isso, era importante que o Governo tivesse uma atitude mais receptiva às propostas da oposição e que houvesse um grande acordo entre todos os partidos, ou alguns deles. Era importante que as questões da Justiça fossem subtraídas ao tiroteio político.

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