quarta-feira, fevereiro 07, 2007

Ministério da Justiça e PSP consideram que o Tribunal de Faro é um perigo para a segurança de magistrados, advogados, funcionários e público.
De acordo com relatórios da PSP e da Direcção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ), a que o CM teve acesso, o tribunal algarvio – onde se realizam cerca de dez julgamentos por dia – regista “graves vulnerabilidades” ao nível do controlo de acessos, que “afectam a protecção de pessoas e bens”.
A PSP diz mesmo que até a segurança do segredo de justiça está em causa. “A principal vulnerabilidade prende-se com a organização interna do edifício, que obriga à circulação, pelos mesmos canais, de magistrados, funcionários, detidos e público em geral.
A ausência de controlo de acessos no interior do edifício também prejudica a protecção dos próprios processos, já que é relativamente simples ao público deambular pelo interior do tribunal”, pode ler-se no relatório assinado pelo intendente Guerreiro Cabrita, no dia 7 de Novembro do ano passado.
E para reduzir os riscos, a PSP, na altura, propôs quatro medidas, duas imediatas – alteração da circulação dos detidos no interior do Tribunal e colocação a título experimental de um agente no interior do Tribunal – e duas a aplicar em Janeiro – definição de controlo de acessos e reforço da videovigilância.
Segundo fonte judicial que trabalha no Tribunal de Faro, apenas foi cumprida uma das medidas, o destacamento de um agente para o interior do tribunal: “Mas só lá esteve até final de Janeiro. Depois teve de sair, pois a PSP de Faro deixou de ter agentes disponíveis.”
Já o relatório do DAGJ, assinado pelo major Silvestre Machado, no dia 2 de Janeiro, recomenda, entre outras medidas, a colocação de um pórtico detector de metais, uma porta de segurança na entrada destinada ao detidos e um eficaz sistema de videovigilância que permita à PSP aceder às imagens.
Contactado pelo CM, António Ventinhas, da direcção do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, confirmou que, apesar dos relatórios da PSP e de o próprio Ministério da Justiça “nada foi feito” em termos de segurança, no Tribunal de Faro: “Em causa não estão só os perigos ao nível da integridade física das pessoas. Também nas questões de prevenção de incêndio há problemas. Tanto no tribunal judicial como no cível de Faro. Este último está instalado num apartamento e tem grandes quantidades de papel acumuladas. E se forem feitas vistorias existe grande probabilidade de o tribunal fechar.”
Confrontado com os relatórios a que o CM teve acesso, fonte do Ministério da Justiça adiantou que, em Novembro do ano passado, o Tribunal de Faro foi alvo de vistorias, estando a ser agora analisado o estudo para “medidas futuras, se necessárias”. A mesma fonte adiantou também que a DGAJ se candidatou a fundos comunitários para aumentar a rede de videovigilância e que os ministérios da Justiça e da Administração Interna “possuem já um grupo de trabalho para analisar e propor medidas de segurança nos tribunais a nível nacional”, grupo que integra, entre outros, representantes dos magistrados.
SALAS DE AUDIÊNCIA SEM CONTROLO
Nove degraus separam a rua do interior do Tribunal da Comarca de Faro, um obstáculo fácil de ultrapassar para quem pretende chegar às duas salas de audiência. As portas estão abertas e nada nem ninguém impedem ou controlam a entrada de quem quer que seja, comprovou o CM no local. Qualquer pessoa chega facilmente às salas de audiência sem que seja revistado ou identificado. Junto às escadas para o piso 2, andar onde está instalada a secretaria dos 1.º e 2.º Juízos Criminais e a Sala de Audiências 2, há uma secretária e respectiva cadeira, onde apenas desde Novembro se encontra um segurança, em horário de expediente. Diz “bom dia” e “boa tarde” a quem sobe e pouco mais. “Não tem outras instruções”, disse ao CM uma fonte judicial que conhece bem o funcionamento do tribunal. Os arguidos mais perigosos entram pela porta lateral. Os restantes pela principal. Nos últimos tempos, apenas uma melhoria: após um Verão de altas temperaturas, o sistema de ar condicionado começou a funcionar. Funcionários e magistrados deixaram de recorrer às ventoinhas nos julgamentos.
TIROS NO TRIBUNAL DE PORTALEGRE
Um homem de 32 anos foi detido anteontem durante a tarde por ter disparado uma pistola de alarme e ameaçado funcionários judiciais em pleno Tribunal de Portalegre. O indivíduo entrou nas instalações, fechou as portas e fez um disparo para a rua. Segundo testemunhas, “queria falar com o ministro da Justiça”, chegando mesmo a ameaçar “um banho de sangue”. Chamada ao local, a PSP pôs cobro à situação, tendo apreendido a pistola, bem como um carregador com munições. O homem tem contra si vários processos judiciais pendentes, quase todos relacionados com penhoras e arrestos. À hora de fecho desta edição continuava a ser ouvido em primeiro interrogatório pelo crime de sequestro.
APONTAMENTOS
ARMA APREENDIDA
Uma mulher de etnia cigana foi apanhada com um revólver no Tribunal de Faro (Dezembro de 2006). Só foi revistada à entrada, devido à intervenção de uma pessoa que, na rua, a viu esconder a arma nas roupas e avisou as autoridades.
TENTATIVA DE AGRESSÃO
Em Novembro de 2006, um procurador teve de trabalhar até às 21h30. Quando saiu, foi alvo de tentativa de agressão. Conseguiu refugiar-se a tempo no interior do Tribunal de Faro e chamou o Corpo de Intervenção da PSP, que dispersou a multidão que o esperava.
PANCADARIA
No final do ano passado, os familiares de quatro arguidos protagonizaram no interior do Tribunal de Faro uma sessão de pancadaria que durou mais de meia hora.
UNISSEXO
O Tribunal de Faro tem três casas de banho: duas para funcionários e uma para o público. Todas unissexo. As senhoras têm de pedir a outra pessoa que faça guarda. Já houve quem pedisse o livro de reclamações.
Correio da Manhã.
A situação retratada na notícia que antecede é, infelizmente, paradigmática do estado calamitoso a que chegaram muitos dos chamados "palácios" da Justiça do nosso país.
Não se pense, por isso, que se trata de um caso de "fachada".
O dia-a-dia de magistrados, advogados e funcionários é, no mínimo, bastante deprimente, a contrastar com o luxo faraónico que impera noutros lugares.
E aqueles que pensam que as condições de trabalho são questões menores e que não contendem com a independência do poder judicial deixam-se enganar.
Convenhamos, a Justiça não se faz com uma bandeira, algumas bancadas e meia dúzia de cadeiras.

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