terça-feira, dezembro 13, 2005

«Sampaio segura Souto Moura»

«Jorge Sampaio deixou claro, publicamente, que prefere manter Souto Moura, apesar do recente "cerco", por parte do PS, ao procurador-geral da República. No discurso que proferiu este sábado na Ordem dos Advogados a propósito dos 57 anos da Declaração Universal dos Direitos do Homem, Jorge Sampaio admitiu mudanças "no quadro da definição e execução da política criminal", mas mostrou-se contrário, para já, a mexidas ao nível dos protagonistas. O Presidente quer que sejam instituídos novos "meios de o Governo e o Ministério Público prestarem contas da sua acção", mas recusou claramente que as alterações devam começar pelos titulares de cargos de responsabilidade. Assim, "não se pense que a mudança de protagonistas constitui solução para o que quer que seja", disse. Mais claro ainda, Sampaio afirmou "Primeiro, cuide-se do quadro de actuação e só depois das pessoas e da sua eventual substituição, se e na medida em que o novo quadro o possa aconselhar". As declarações de Jorge Sampaio surgem numa altura em que Souto Moura está a dez meses de finalizar o seu mandato como procurador-geral da República e em que se desenham precisamente alterações no quadro legislativo, com a aprovação pelo Governo, no início deste mês, da nova Lei-Quadro da Política Criminal, a qual permitirá ao Governo definir, de dois em dois anos, as prioridades do combate ao crime, uma possibilidade que neste momento não existe. A lei aguarda aprovação no Parlamento, e porá fim à agora vigente total autonomia de investigação por parte do Ministério Público, tutelado por Souto Moura. Depreende-se das declarações de Sampaio que o Presidente considera que só depois da clarificação deste novo quadro legal se deve pensar - ou não - em mexer nos responsáveis. Por outro lado, as declarações de Jorge Sampaio surgiram no mesmo dia em que o Expresso tornou pública a intenção de os advogados de Ferro Rodrigues de lançar um incidente de recusa do procurador-geral da República, com base numa acusação de "parcialidade clara" no processo Casa Pia. O objectivo é afastar Souto Moura de qualquer decisão processual nos casos que envolvam o ex-secretário-geral do PS. Souto Moura admitira já, terça-feira passada, falhas várias na condução do processo Casa Pia por parte do Ministério Público. O procurador, que avocou a si a condução daquele processo, reconheceu agora que esta "não foi a ideal", mas, ao mesmo tempo, afirmou não ter recebido qualquer prova de uma cabala política contra o PS. O procurador-geral tem estado na mira do poder político, mas o Ministério Público também deixou sair para a imprensa escutas telefónicas, realizadas no âmbito do processo Portucale, que revelam conversas entre dirigentes do PS e do CDS em que os socialistas procuram apoio para destituir Souto Moura. As mesmas escutas revelam que esta intenção terá sido travada por Jorge Sampaio. Aliás, o tema das escutas (número, a quem, em que condições, etc.) é dos principais focos de critica a Souto Moura. A clarificação pública da posição de Jorge Sampaio quanto à continuidade de Souto Moura surge também numa altura em que o tema deu já entrada na campanha eleitoral para as presidenciais. O próximo inquilino de Belém terá de tomar posição sobre esta matéria. O sucessor de Jorge Sampaio deve tomar posse em Março, ou seja, a seis meses do fim de mandato de Souto Moura. Os candidatos à Presidência da República têm sido confrontados, em entrevistas e nos debates televisivos, com a eventual substituição de Souto Moura. Até agora, apenas Manuel Alegre deixou a porta aberta à sua eventual substituição antecipada».
In Diário de Notícias, 13/12/2005.

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