domingo, janeiro 08, 2006

"«Antes das comissões morria quase uma criança por semana»"

"Antigo procurador do Tribunal de Menores do Porto garante que era este o cenário na Invicta. Comissões já receberam 45 mil casos. «E muitas tragédias conseguiram evitar», sublinha. Governo anunciou reforço de meios. Comissões esperam para ver e temem pela demora das medidas.
Faltam técnicos, formação e nem sempre funcionam como deviam, mas as comissões de protecção de menores vieram, apesar de tudo, ajudar a evitar mais tragédias. Esta é, pelo menos, a convicção de alguns juízes e procuradores ouvidos pelo PortugalDiário.
«Se as comissões acabassem e os processos de menores regressassem todos aos tribunais, não tenho dúvidas de que o número de mortes subiria em flecha», assegura o antigo procurador do Tribunal de Família e Menores, Maia Neto, que actualmente integra a Comissão Nacional de Crianças e Jovens em Risco.
Em plena década de 90, ainda sem comissões de protecção de menores, «quase todas as semanas morria uma criança no Porto devido a maus tratos», garante.
Nessa altura, todos os processos relacionados com menores eram acompanhados pela Segurança Social. «O tribunal esperava meses pelos relatórios das assistentes sociais e muitas vezes as crianças morriam antes de aqueles chegarem», garante Maia Neto, acrescentando que «a escassez de pessoal levava a que cada técnico acumulasse muitas centenas de processos».
Sem elementos sobre a situação dos menores, o procurador não tinha outra solução: «Cheguei a recusar despachar processos porque não tinha informação».
Apesar de todas as deficiências que lhe são apontadas, «as comissões de protecção de menores apreciaram, desde que foram criadas em 2001, cerca de 45 mil casos. E muitas tragédias conseguiram evitar», sublinha Maia Neto.
Opinião idêntica tem o juiz Filipe Melo, que há várias anos exerce funções no Tribunal de Família e Menores de Vila Nova de Gaia. O número de mortes era muito superior nos anos que antecederam a criação das comissões «mas essa realidade não era conhecida e a Comunicação Social não fazia eco dos casos».
O reforço de técnicos nas comissões, a aposta na formação, a colocação de um professor a meio tempo para fazer a articulação com a escola, local onde muitos casos aparecem sinalizados, são medidas que o juiz de Gaia considera importantes, a par também da maior articulação com o Ministério Público, que passará a reunir-se mensalmente com as comissões.
«Uma comissão de protecção de menores por freguesia seria o ideal», garante. «Gastar dinheiro com as comissões» é o que é preciso, acrescenta este juiz, que apesar das novidades anunciadas, ainda teme que os governantes queiram fazer «omeletes sem ovos».
As novidades anunciadas deixam as comissões expectantes. Para o jurista da Comissão de Protecção de Menores da Amadora, Fernando Pereira, as medidas são positivas, mas agora teme pela «demora na sua concretização». A comissão da Amadora é uma das que acumula mais processos, cerca de 1200 no ano de 2004. Actualmente conta com dez técnicos, pelo que terá direito a cinco novos profissionais.
Também a presidente da Comissão de Lisboa-Centro, a maior de Lisboa em número de freguesias abrangidas, prefere «aguardar para ver». Refira-se que esta comissão chegou, em Março do ano passado, a rejeitar apreciar os processos posteriores a Outubro de 2004 por falta de meios humanos para o efeito (ver texto relacionado: Comissões de Protecção de Menores paradas»). Agora deverá receber mais cinco técnicos.
Contactada pelo PortugalDiário a anterior presidente da Comissão Nacional de Crianças e Jovens em Risco, Dulce Rocha, não quis comentar as medidas anunciadas para o sector".
In POrtugal Diário, 08/01/2006.

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