«Escutas provocam debate aceso entre advogados, magistrados e polícias»
«O coordenador da Unidade de Missão para a Reforma Penal, Rui Pereira, defendeu ontem, num debate sobre as escutas telefónicas promovido pelo Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), no Café Martinho da Arcada, em Lisboa, que a lista dos crimes alvo de escutas telefónicas não deve mudar, para não diminuir as possibilidades de investigação criminal.
Outra proposta deste especialista em Direito Penal e professor na Universidade Nova de Lisboa vai no sentido de a lei esclarecer qual o prazo em que as escutas devem ser apresentadas ao juiz, porque a expressão "imediatamente", consagrada na lei (artigo 188.º do Código do Processo Penal), é "muito vaga". As escutas devem dirigir-se apenas a arguidos e suspeitos, sublinhou Rui Pereira, defendendo que uma comissão formada por três membros do Conselho Superior da Magistratura e designados por este deve verificar os procedimentos técnicos das operadoras envolvidas e centralizar os números das escutas, isto sem conhecer o respectivo conteúdo. Esta última proposta causou alguma celeuma entre os participantes no debate - dedicado ao tema dos meios de obtenção de prova, mas que se centrou essencialmente nas escutas telefónicas -, entre os quais se encontravam juízes, advogados e elementos dirigentes da Polícia Judiciária (PJ) e do Ministério Público. Isto porque houve quem pensasse que o coordenador da Unidade de Missão para a Reforma Penal estivesse a defender uma comissão administrativa para fiscalização das escutas, ideia que Rui Pereira negou. A intervenção mais polémica partiu, no entanto, do advogado José António Barreiros, que questionou as razões por que se discutem agora isoladamente as escutas telefónicas, quando, tradicionalmente, estas estão associadas a outras duas questões problemáticas na justiça portuguesa: o segredo de justiça e a prisão preventiva. "Discute-se agora porque estão grandes figuras envolvidas?", perguntou o advogado, que actualmente defende as vítimas do processo da Casa Pia. Para Barreiros, as escutas são "um meio intrusivo por excelência" e "um meio de enorme deslealdade, porque podem sofismar garantias". E citou como exemplo a mulher de um arguido ser surpreendida numa escuta telefónica a incriminar o marido e esses factos serem utilizados contra este, quando a lei prevê que um cônjuge se possa recusar a incriminar o outro. O advogado da Casa Pia comparou as escutas telefónicas a "uma confissão", na medida em que "é um sossegar de consciência para o juiz, porque o pode libertar da angústia de julgar". Ao mesmo tempo, afirmou, "é um meio extremamente tentador, porque suscita toda a espécie de preguiça" na procura de outros meios de prova. Para Barreiros, há que encontrar, para as escutas, "uma limitação temporal estrita e conectada com um objectivo". E, afirmou o advogado, as escutas "podem criar um problema de honorabilidade". E, mais uma vez, deu um exemplo: o de alguém, enquanto investigador policial, ter acesso a uma informação altamente classificada, relacionada com o crime financeiro, e, mais tarde, mudar de actividade profissional e passar, ele próprio, a trabalhar na área da finança. "O que é que ele faz? Joga fora, apaga a informação? Há quem se esqueça de apagar. E há quem tenha tendência para guardar." Barreiros declarou-se ainda "absolutamente contra as transcrições" das escutas. "A escuta é um controlo, delimitado no tempo, e não se transcreve, porque a escuta é um meio oral e não documental." E falou nos riscos de as escutas serem feitas por funcionários "mais novos" da PJ. Teófilo Santiago, director nacional adjunto da PJ e responsável pelo Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP), reagiu com irritação a estas observações, considerando que o advogado fizera "um juízo de suspeição relativamente às polícias" que lhe parecia "excessivo". "As escutas são, de facto, um meio de investigação preguiçoso e cómodo, mas não são um meio de prova, são um meio de obtenção de prova", frisou. Quanto às transcrições, também as considerou desnecessárias. "Ao juiz seria suficiente um resumo e evitaria a pornografia diária de ver as transcrições das escutas." Santiago refutou as críticas de que as escutas estariam acessíveis a um número excessivo de pessoas. "O acesso às escutas é dado através de uma password a que só tem acesso o investigador do inquérito. Não são juniores nem são seniores. Discutir o edifício com base em desconfianças é injusto. Este desconchavo resulta das situações pornográficas que temos vindo a viver", acusou. Euclides Dâmaso, responsável pelo DIAP em Coimbra, afirmou: "As escutas sempre foram feitas aos crimes de catálogo, sempre com autorização judicial, e sempre sobre suspeitos ou arguidos. O controlo que hoje se faz sobre as escutas é um luxo em relação ao que sucedia há 15 ou 16 anos. Por que é que se coloca agora o problema?"»
In Público.pt, de hoje.
Outra proposta deste especialista em Direito Penal e professor na Universidade Nova de Lisboa vai no sentido de a lei esclarecer qual o prazo em que as escutas devem ser apresentadas ao juiz, porque a expressão "imediatamente", consagrada na lei (artigo 188.º do Código do Processo Penal), é "muito vaga". As escutas devem dirigir-se apenas a arguidos e suspeitos, sublinhou Rui Pereira, defendendo que uma comissão formada por três membros do Conselho Superior da Magistratura e designados por este deve verificar os procedimentos técnicos das operadoras envolvidas e centralizar os números das escutas, isto sem conhecer o respectivo conteúdo. Esta última proposta causou alguma celeuma entre os participantes no debate - dedicado ao tema dos meios de obtenção de prova, mas que se centrou essencialmente nas escutas telefónicas -, entre os quais se encontravam juízes, advogados e elementos dirigentes da Polícia Judiciária (PJ) e do Ministério Público. Isto porque houve quem pensasse que o coordenador da Unidade de Missão para a Reforma Penal estivesse a defender uma comissão administrativa para fiscalização das escutas, ideia que Rui Pereira negou. A intervenção mais polémica partiu, no entanto, do advogado José António Barreiros, que questionou as razões por que se discutem agora isoladamente as escutas telefónicas, quando, tradicionalmente, estas estão associadas a outras duas questões problemáticas na justiça portuguesa: o segredo de justiça e a prisão preventiva. "Discute-se agora porque estão grandes figuras envolvidas?", perguntou o advogado, que actualmente defende as vítimas do processo da Casa Pia. Para Barreiros, as escutas são "um meio intrusivo por excelência" e "um meio de enorme deslealdade, porque podem sofismar garantias". E citou como exemplo a mulher de um arguido ser surpreendida numa escuta telefónica a incriminar o marido e esses factos serem utilizados contra este, quando a lei prevê que um cônjuge se possa recusar a incriminar o outro. O advogado da Casa Pia comparou as escutas telefónicas a "uma confissão", na medida em que "é um sossegar de consciência para o juiz, porque o pode libertar da angústia de julgar". Ao mesmo tempo, afirmou, "é um meio extremamente tentador, porque suscita toda a espécie de preguiça" na procura de outros meios de prova. Para Barreiros, há que encontrar, para as escutas, "uma limitação temporal estrita e conectada com um objectivo". E, afirmou o advogado, as escutas "podem criar um problema de honorabilidade". E, mais uma vez, deu um exemplo: o de alguém, enquanto investigador policial, ter acesso a uma informação altamente classificada, relacionada com o crime financeiro, e, mais tarde, mudar de actividade profissional e passar, ele próprio, a trabalhar na área da finança. "O que é que ele faz? Joga fora, apaga a informação? Há quem se esqueça de apagar. E há quem tenha tendência para guardar." Barreiros declarou-se ainda "absolutamente contra as transcrições" das escutas. "A escuta é um controlo, delimitado no tempo, e não se transcreve, porque a escuta é um meio oral e não documental." E falou nos riscos de as escutas serem feitas por funcionários "mais novos" da PJ. Teófilo Santiago, director nacional adjunto da PJ e responsável pelo Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP), reagiu com irritação a estas observações, considerando que o advogado fizera "um juízo de suspeição relativamente às polícias" que lhe parecia "excessivo". "As escutas são, de facto, um meio de investigação preguiçoso e cómodo, mas não são um meio de prova, são um meio de obtenção de prova", frisou. Quanto às transcrições, também as considerou desnecessárias. "Ao juiz seria suficiente um resumo e evitaria a pornografia diária de ver as transcrições das escutas." Santiago refutou as críticas de que as escutas estariam acessíveis a um número excessivo de pessoas. "O acesso às escutas é dado através de uma password a que só tem acesso o investigador do inquérito. Não são juniores nem são seniores. Discutir o edifício com base em desconfianças é injusto. Este desconchavo resulta das situações pornográficas que temos vindo a viver", acusou. Euclides Dâmaso, responsável pelo DIAP em Coimbra, afirmou: "As escutas sempre foram feitas aos crimes de catálogo, sempre com autorização judicial, e sempre sobre suspeitos ou arguidos. O controlo que hoje se faz sobre as escutas é um luxo em relação ao que sucedia há 15 ou 16 anos. Por que é que se coloca agora o problema?"»
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