quarta-feira, novembro 28, 2007

Juizes Políticos

Não é boa a imagem do Poder Judiciário do Maranhão, às voltas com suspeitas de intimidação política, denúncias de nepotismo e, salvo engano, com alguns de seus desembargadores sendo investigados pela Polícia Federal.
Salta aos olhos agora que mais uma mancha terrível pode recair sobre o Tribunal de Justiça do Estado por conta de incursões políticas do senador amapaense José Sarney para eleger sua cunhada Nelma Sarney para o Tribunal Regional Eleitoral. Seria o primeiro passo do tal terceiro turno de que Sarney falou quando Roseana perdeu as eleições para Jackson Lago. Por trás dessa toga e dessa droga estão armando mais uma vez contra a vontade expressa nas urnas pelo povo do Maranhão. É evidente que com tantos interesses localizados, por conta da eleição e derrota de 2006, o esquema Sarney tenha todo afã em ocupar cargos estratégicos nas cortes de Justiça do Estado. Principalmente no TRE. O Tribunal de Justiça não pode cometer esse erro. Juridicamente, a desembargadora Nelma sempre atendeu aos interesses de seus parentes e não há motivos para que ninguém espere que seja diferente agora. Além do mais, fere todos os princípios éticos e de Direito ter a Corte de Justiça máxima do Estado seu nome envolvido em barganhas políticas. Entenda-se que a par de valores genéricos e estáveis a ética é ajustável a cada época e circunstância. Na atual circunstância, não nos parece ético que o TJ eleja para o TRE aparentados de políticos. Assim como cabe ao advogado defender com o mesmo denodo humildes e poderosos e não permitir que os anseios de ganho material sobrelevem a finalidade social de seu trabalho, (Código de Ética – Conselho Federal da OAB), um dos compromissos éticos conferidos ao magistrado é não se deixar corromper pelo poder que lhe é conferido.
Rui Barbosa disse que “o ingresso de magistrados em partidos políticos representa sua renúncia à imparcialidade”. Não sabemos se Nelma Sarney faz parte de algum partido político, mas que ela faz parte da família Sarney e o senador Sarney está tendo todo interesse em alçá-la ao TRE. Celso Antônio Três, para quem o Brasil causa espasmos a Montesquieu vilipendiando a tripartição dos Poderes, chama situações mais ou menos símiles ocorridas nos tribunais superiores de Brasília de “esquizofrenia de personalidades: ora juízes, ora políticos”.
Cá entre nós maranhenses, as candidaturas de Nelma Sarney e Cleones Cunha estão repercutindo pessimamente nos meios jurídicos da capital. Há advogados, promotores, juízes e outros menos togados que não estão gostando nada de ver o Tribunal Regional Eleitoral no centro de uma disputa política entre dois grupos que exatamente nesse momento se digladiam na Justiça Eleitoral.
O risco na existência de juízes políticos pode ser inferido completamente de uma matéria do Correio Braziliense, datada de 2002, sob o título “Jobim ensinou como fazer”. A matéria transcreve declarações do ministro Nelson Jobim a membros de seu Partido, o PMDB: “Não façam um recurso”, explicou Jobim. “Porque vai para o mesmo ministro. Pode ele negar e aí, já viu. Entrem com um agravo regimental e um mandado de segurança contra liminar, porque aí vem direto para mim”, continuou, segundo relato de peemedebistas.
Jobim orientou Temer a entregar os documentos na casa de um de seus assessores no TSE, no Lago Sul. Esse assessor faria então uma minuta de despacho para que Jobim assinasse em seguida. Às 5 horas os peemedebistas chegaram à casa do assessor. Menos de uma hora depois, o despacho estava pronto. Jobim garantia, assim, a convenção do Partido pelo qual foi Deputado e Ministro da Justiça”.
Imaginem o que pode acontecer se Nelma Sarney se tornar Corregedora e até presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão!
Em carta encaminhada ao Jornal Pequeno e publicada na página 3 desta edição, a desembargadora Nelma Sarney discorda da posição do Jornal Pequeno e garante que a candidatura dela não está causando nenhum alvoroço no meio jurídico. Leia.
Não há muito o que debater em torno dessa censurável aproximação entre magistrados e políticos, inclusive com nomeações para cargos de confiança política e cargos de confiança em tribunais. Já há juristas que entendem que até a dependência da Polícia Judiciária dos Governos estaduais é danosa, pois abriria portas para o controle político de determinadas investigações. O controle de grupos políticos sobre os tribunais, nem se fala.
Tudo isso é perigoso, se pensarmos que dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal 7 foram indicados por Lula e os quatro restantes ficaram na cota de José Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Collor de Melo. É de se perguntar se, em se tratando de julgamentos políticos, deve-se esperar imparcialidade ética e constitucional desses senhores.
Nossa condição de província, onde todo mundo parece ser vizinho de todo mundo e todos os “alguéns” parecem dever enormes favores a alguém, indica que não é saudável, aliás, pode ser letal para as instituições democráticas, que juízes com ligações umbilicais com chefes políticos ocupem cargos em tribunais eleitorais, como é o caso de Nelma Sarney.
Nos dias em que vivemos, “Mandados de Injunção” permitem até que magistrados criem normas provisórias para suprir as deficiências do Poder Legislativo. Pensem só no que pode significar tamanho poder nas mãos da desembargadora Nelma Sarney quando ela tiver que decidir demandas judiciais envolvendo o Estado e o grupo político do seu parente José Sarney. A simples admissão dessa possibilidade é imoral.
Se avaliarmos que por aqui não há sequer um Conselho da Magistratura atuando que surta efeito sobre a organização interna do Poder Judiciário e suas relações com o sistema político, entenderemos que a consciência de cada um dos membros do Tribunal de Justiça (una ou coletiva) não deve se permitir embotar por injunções políticas de quem quer que seja. E essa idéia não é nossa, é da Associação dos Juízes Federais do Brasil, que vê no Conselho Nacional de Justiça também a oportunidade de identificar o papel político dos juízes sem ferir o conjunto de instrumentos à disposição do cidadão.
Em outras palavras, não se trata de controlar o juiz na sua atividade jurisdicional, mas de prevenir o controle do Poder Judiciário em sua atividade político-administrativa. Há casos incríveis de juízes dando palpites em público sobre atos praticados por categorias que ele mesmo, juiz, irá julgar. Diz-se que Celso de Mello (indicado por Sarney) produzia votos durante as sessões do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes vivia às turras com o Ministério Público, e Carmem Lúcia comanda abertamente uma campanha por Reforma Política no país. E o exemplo mais grave do ex-ministro do STJ Costa Leite, que fez do cargo explícito palanque político e acabou saindo candidato a vice-presidente na chapa de Antonhy Garotinho.
A indicação de Nelma Sarney para a Corregedoria e Vice-presidência do T.R.E., no exato instante em que o grupo político comandado por sua família intenta cassar o mandato do governador Jackson Lago depõe contra o espírito da República e da democracia, e transforma o Tribunal em ante-sala do poder político. É como se o Governo do Estado, além da oposição na Assembléia e no Congresso Nacional, passasse a enfrentar a permissividade de uma oposição jurídica no Tribunal Regional Eleitoral e no Tribunal de Justiça. O mais inusitado e aparvalhado caso de intervenção nas instituições públicas de um Estado.
In Jornal Pequeno.com

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