terça-feira, novembro 13, 2007

Justiça no Brasil.

13 de Novembro de 2007 - A maioria dos brasileiros tem muitas dúvidas sobre a eficiência da Justiça. À primeira vista, ela parece não ser igual para todos, em função de seu alto custo e todos os meandros que se têm de percorrer para chegar a um julgamento final. Um bom advogado é muito caro e para ter conhecimento de todos os trâmites, lacunas e superveniências das leis é necessário alguém que conheça bem o ordenamento jurídico e o emaranhado dos nossos códigos legais. O mais comum dos procedimentos é utilizar-se dos inúmeros recursos previstos no código processual penal para estender os processos ao longo do tempo, de modo que se obtenha a prescrição do direito do Estado de aplicar a pena pelo decurso de prazo. Não é de espantar que menos de 5% dos criminosos condenados são presos, restando à sociedade conviver com os 95% restantes. Bom exemplo de sistema Judiciário que do descrédito passou a ser respeitado foi a Justiça italiana, a qual desenvolveu o "projeto mãos limpas", desarticulando o poder da máfia no país. Alguns juízes levaram a sério a guerra contra o crime organizado arriscando suas vidas e praticaram a justiça até suas últimas conseqüências. No Brasil, após longo prazo de insatisfação e desalento, vislumbramos algumas ações do nosso Judiciário, trazendo esperança de que a atuação mais ativa venha a resgatar a autoridade e o respeito às leis e maior punibilidade para os seus infratores. Esta transformação é visível pelas últimas ações do Supremo Tribunal Federal (STF), que tem dado maior dinâmica às decisões que costumeiramente se prolongam por muitos anos. Prova disso é a edição da Lei n 11.417, de 19 de dezembro de 2006, que disciplina a edição de súmula vinculante pelo STF. Dessa forma, o STF pode, após reiteradas decisões sobre determinada matéria constitucional, editar enunciado de súmula que terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Além da possibilidade de edição de súmula vinculante, o que tende a acelerar os processos e a diminuir os casos em que o assunto já se encontra decidido pela instância máxima, nota-se também a mudança da dinâmica do próprio STF, a exemplo do que aconteceu com o julgamento do indiciamento dos "mensaleiros". Outra manifestação positiva do STF foi o julgamento da troca de partidos pelos políticos em geral que constantemente se adequam aos movimentos de poder. Demonstrações como estas e outras têm sido dadas pela alta corte que tem ocupado, muitas vezes, o espaço que o Congresso deveria estar ocupando e que por letargia ou comodidade corporativa vem postergando regulamentações às leis criadas na vigência da Constituição de 1988. Algumas melhorias têm sido sentidas, também, nos Tribunais de Justiça estaduais com pouca repercussão ou mesmo conhecimento da sociedade. Como exemplo, o acervo de processos no Tribunal de Justiça de São Paulo diminuiu. O número total de recursos aguardando julgamento caiu de 509.219 para 409.127 nos últimos anos. Isto foi possível pela criação das câmaras extraordinárias e pelo maior empenho dos juízes para a redução de pendências judiciais. Um fato específico que poderia reduzir o volume de ações no Judiciário diz respeito aos processos do poder Executivo em relação ao sistema fiscal e às leis do trabalho. Existem hoje milhares de processos de execução de dívida fiscal contra administradores e executivos de empresas brasileiras que apenas entulham a Justiça, sem que haja reconhecidamente responsabilidade destes pelo motivo da autuação. Na falta de pagamento pelas empresas de tributos ou benefícios trabalhistas, justificados ou não, as autoridades fiscais, estaduais, federais e municipais listam os administradores dos últimos 10 anos, executando-os pela falta de recolhimentos. Ocorre que, de acordo com o art. 927 do Código Civil, e melhor explicitado no art. 158 da Lei das Sociedades Anônimas, a responsabilidade dos administradores decorre, em última instância, de atos, frise-se, ilícitos. Dessa forma, o administrador será responsável somente se agir com dolo ou culpa, mesmo que dentro das limitações de competência previstas no contrato/estatuto. Ou então, quando ultrapassar os atos regulares da gestão. Neste sentido, a utilização da penhora on-line, ferramenta introduzida pela Lei n 11.382/2006, criada inicialmente para conceder maior celeridade e segurança jurídica nos processos de execução, foi desvirtuada principalmente nos casos em que se trata de bloqueio de conta dos administradores, sendo utilizada de forma precipitada pelo Judiciário brasileiro. Fato é que está sendo cada vez mais difícil ser administrador de empresas neste país, tendo em vista as regras -- ou a falta delas -- que não punem apenas fraudes ou gestão desonesta, mas responsabilizam os administradores por quaisquer acidentes econômicos sofridos pelas empresas. O risco aumenta por não ser analisado o período da gestão dos administradores, isto é, não é verificado se o fato gerador ocorreu durante a sua gestão, e quando ele é citado o processo se encontra em fase de execução - o que prejudica deveras seu direito de defesa. Assim, tais administradores são surpreendidos por bloqueio automático de contas bancárias ou contas de investimentos, restando a eles apenas a tentativa de reter os recursos bloqueados na conta da Justiça, antes que sejam passadas aos órgãos reclamantes. Mesmo quando provada a não responsabilidade pela infração com atas societárias que definem tal fato, os juízes de 1 instância não têm acatado de plano e liberado os administradores que nada têm a ver com os períodos dos fatos geradores que provocaram a autuação e, como resultado, sobrecarregam as instâncias superiores com defesas objetivas e autoprovadas. Não há estatísticas que mostrem os números de processos contra executivos, mas como a Justiça retroage dez anos, pode-se imaginar o grande número de autuações de diretores estatutários que ocorrem e que ainda ocorrerão. A simples verificação de nomes dos administradores responsáveis pelo período do fato gerador evitaria um enorme desperdício de tempo e custos para os dois lados, tanto à Justiça quanto aos administradores. A Justiça pode, e deve, ser uma das instituições que promovam a mudança de valores neste País. Certamente, este é um dos caminhos que, aliados a maiores investimentos em educação, poderão mudar o padrão social e o posicionamento do Brasil no concerto mundial. Alguns passos importantes estão sendo dados. Cabe a nós exercitar nossos direitos como cidadão, para acelerar a transformação de nossa sociedade.
In Gazeta Mercantil.

Sem comentários: